Pena para a pessoa que fizer a denúncia mentirosa é de detenção de um a seis meses ou multa.
Furtos, roubos, sequestros e tantos outros crimes engrossam as estatísticas. Porém, nem sempre esses delitos aconteceram de fato. Mentiras e desculpas podem ser inventadas para acobertar situações, mas, se denunciadas à polícia ou descobertas, podem configurar fraude e o crime que antes não existia passa a existir. De 2012 a fevereiro deste ano, o Oeste Paulista registrou 109 casos de comunicação falsa de crime, segundo levantamento feito pelo G1.
Os dados da Polícia Civil foram extraídos do Boletim Estatístico Eletrônico, conforme informou o Sistema Integrado de Informações ao Cidadão (SIC). Na região em que atua o Departamento de Polícia Judiciária com sede em Presidente Prudente, o Deinter-8, formada por 54 cidades, foram registrados 12 casos em 2011, 20 em 2013, 27 em 2014, 25 em 2015, 20 em 2016, e cinco em janeiro e fevereiro de 2017.
O artigo 340, do Código Penal, institui que o delito consiste em "provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado". E, para esse crime, a pena é de detenção de um a seis meses ou multa.
Casos e equívocos
Conforme o delegado Pablo Rodrigo França, que atua na Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Presidente Prudente, a unidade apura os casos considerados mais graves, que apresentem violência ou grave ameaça, como roubos, sequestros, latrocínio e homicídios, por exemplo. Além disso, por ter um alto índice estatístico, os furtos a veículos também são checados pela especializada.
Ele ressaltou que quem atua na DIG de Presidente Prudente está há muito tempo trabalhando e todos têm uma noção dos casos que acontecem e do que não é condizente com o município. “Dependendo da região em que você trabalha, você sabe os tipos de crimes que ocorrem, o que é impossível e nunca aconteceu. Quando você se depara com uma situação que nunca vivenciou, desconfia que pode ser uma fraude. Cada delegacia apura os casos de comunicação falsa de crime, de acordo com a sua atuação”, pontuou o delegado ao G1.
França explicou que, apesar do elevado número de casos de comunicação falsa de crime, o número de pessoas que registram ocorrências que não existiram é muito maior. Ele salientou que nem sempre quando alguém faz um Boletim de Ocorrência sobre uma situação que não existiu configura crime.
"Depende da ausência ou não de dolo. Ou seja, se a pessoa quis mentir sobre o crime ou se ela apenas se equivocou. O que acontece muito são pessoas que saem da balada, esquecem onde estacionaram o veículo e acham que foram furtadas. Elas procuram a polícia e depois descobre-se que o carro estava estacionado em outro local do que ela achava em que estava", afirmou o delegado.
Mesmo que neste caso o crime não se comprove, não é considerado comunicação falsa. "Não significa que ela agiu com vontade de comunicar falsamente um crime. O equívoco não é crime. O crime é intencionalmente fraudar uma situação para transformar em um crime", pontuou.
Nesta quinta-feira (13), houve o registro de um caso como este. Uma idosa inicialmente informou à polícia que havia sido assaltada e que teria tido prejuízo de quase R$ 10 mil. Todavia, o roubo foi inventado, pois ela ficou com vergonha de ter sido vítima, na verdade, de estelionato no popularmente chamado de "golpe do bilhete premiado". "Ela não fez uma falsa comunicação de crime, mas falsificou a maneira como foi vítima de crime", destacou ao G1.
Agora, se a pessoa registra o crime e depois tem consciência de que não houve a situação delituosa, são suas obrigações voltar e comunicar o "equívoco" à polícia. "Tudo o que você sabe que uma pessoa ética faria é o que precisa ser feito. Vá até a delegacia e fale que se equivocou", disse França.
Um caso que exemplifica o que o delegado falou é um esclarecimento de falso furto de veículo, que aconteceu em janeiro de 2016. O proprietário denunciou o desaparecimento de seu carro após a saída de uma casa noturna. Porém, depois, ele mesmo localizou seu automóvel e não avisou à corporação, mantendo a versão criminosa. Nas investigações, a DIG constatou a fraude e ele foi indiciado por comunicação falsa de crime.
Mais uma situação de que França se recordou foi de uma mulher que perdeu o celular durante um encontro fora de seu relacionamento e inventou para seu namorado que havia sido assaltada na porta de sua casa por dois indivíduos.
Outro caso foi um sequestro que nunca existiu. Entretanto, esse caso foi mais grave, já que a falsa vítima dizia ter sido sequestrada no Estado de Mato Grosso do Sul e acabou localizada no Rio de Janeiro. "No final, descobrimos que ela tinha fugido de casa porque queria ficar longe da família. Ela chegou a pedir resgate para usufruir do dinheiro da família", falou França ao G1.
O delegado também citou o falso roubo que um adolescente inventou para acobertar o furto de R$ 13 mil, dinheiro que ele pegou de seus próprios avós, em março deste ano. "Conseguimos recuperar os objetos que ele comprou com o dinheiro. O garoto inventou um crime para cometer outro", relembrou ao G1.
Adolescente inventou falso roubo para acobertar furto de R$ 13 mil de seus próprios avós, segundo a polícia (Foto: Polícia Civil/Cedida)
Denunciação caluniosa
Outro crime que envolve uma falsa situação é a denunciação caluniosa. França relatou que chegou para ele uma ocorrência de sequestro. "Instaurei um inquérito e o homem reconheceu o seu sequestrador. Pedi a prisão desse indivíduo e busca na casa. Demos cumprimento e quando estava efetuando a prisão ele perguntou o que havia acontecido. Quando falei sobre o sequestro, ele negou e disse que a tal vítima lhe devia dinheiro e que ele tinha ido cobrar essa dívida", disse.
Novamente questionada, a "vítima" confessou que tinha sido ameaçada pelo suposto sequestrador e que tinha inventado o sequestro. "O fato de ele ter sido ameaçado é um crime, mas ele inventou um sequestro, que originou uma medida judicial. Pedi a prisão, o promotor foi a favor, o juiz decretou para depois ele dizer que era mentira. Isso é muito grave. No mesmo inquérito, eu pedi a libertação deste homem, indiciei e pedi a prisão do outro por denunciação caluniosa, que é muito mais grave", enfatizou o delegado da DIG.
No artigo 339, o Código Penal estabelece como delito "dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente", com pena de reclusão, de dois a oito anos, e multa.
Ainda segundo o Código Penal, a pena é aumentada de um sexto, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto. Porém, se a imputação é de prática de contravenção, a pena é diminuída de metade.
Por que é crime?
Diante da experiência e conforme as características do crime, França frisou que os agentes já desconfiam da situação descrita, mas a "vítima" é chamada para comparecer à DIG. "Você não pode chamar a pessoa aqui e constrangê-la porque pode ser uma verdade. Então, você trabalha na linha do duvidoso. Nós procuramos confirmar os dados que a pessoa elenca no registro da ocorrência. Nós temos de provar também a intenção de comunicar um crime falso", explicou.
A comunicação falsa de crime é considerada crime porque o delegado salientou que houve a perda de tempo para a resolução de casos verdadeiros. "No mínimo, dois agentes são designados, a gente tem de mandar viatura, ofício. Há o gasto de tempo e de dinheiro. Por isso que incorre em delito criminal, que é a falsa comunicação, que se agrava se a pessoa ainda apontar alguém como autor do crime, aí configura a denunciação caluniosa. Na falsa comunicação, a pessoa responde em liberdade, mas na denunciação caluniosa a gente pode pedir a prisão", frisou.
França pontuou que, por conta do efetivo, não é possível desvendar todos os casos, mas que a maioria é esclarecida, já que 100% dos registros na DIG são investigados.
"É óbvio que, como não conseguimos desvendar todos os crimes que acontecem, não conseguimos desvendar todas as fraudes, mas a maior parte delas a gente tem desvendado e não tem deixado passar em branco, tem denunciado para que aprendam. É óbvio que, quando perco tempo em um registro que não existe, eu estou perdendo tempo naquele que existe e quanto mais minutos passam do fato para o esclarecimento mais difícil fica. Enquanto você consegue esclarecer mais, quanto mais rápido você atua", destacou.
A profissionalização da polícia também é apontada pelo delegado para o sucesso nas investigações de crimes falsos. "Há um investimento em cada investigação e a polícia não pode perder tempo com casos mentirosos, que são registrados para acobertar problemas conjugais, questões pessoais, ou outros crimes. Isso acontece, talvez, pela crença de uma não investigação, para não ter briga familiar. Mas traz prejuízos aos demais trabalhos", finalizou França ao G1.

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