Pessoas estão muito 'mal humoradas' no Brasil, afirmou cantor ao G1. Ney se apresenta no domingo, às 19h, no Centro de Convenções, com o show 'Atento aos sinais'.
A irreverência de Ney Matogrosso ao desafiar os conceitos de feminino e masculino quando o assunto ainda era tabu social, na década de 1970, foi a vanguarda de nomes que hoje se lançam na música brasileira – Pabllo Vittar, Rico Dalasam e Johnny Hooker, por exemplo. No entanto, quase cinco décadas após o início da carreira, Ney disse ao G1 que “os pensamentos estão muito radicalizados”.
O cantor se apresenta neste domingo (29) às 19h, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, com a turnê “Atento aos sinais”. O show marcou os 40 anos de Ney na música e, há cerca de cinco anos, circula por todo o mundo.
Em uma comparação com os tempos do grupo Secos e Molhados, Ney Matogrosso afirma que o momento atual é mais propício aos questionamentos de gênero e liberdades de orientação sexual. “É perfeitamente natural haver essa mudança. São assuntos que se abrem para as artes, que antes eram restritos aos guetos.”
Apesar disso, Ney aponta um "momento de polarização" no debate. “Parece que as pessoas estão muito mal humoradas. Os pensamentos estão muito radicalizados”, disse. “Eu não tenho esse pensamento assim. Acho que tudo pode, tem lugar pra tudo.”
“Cada um pensa o que quiser pensar, eu não tenho nada contra ninguém. Democracia não é isso?”
Embora nunca tenha levantado a bandeira da luta LGBTI enquanto artista, Ney Matogrosso disse ao G1 que nunca escondeu a homossexualidade, e que optou por não dar destaque à própria orientação sexual como forma de resistência a um sistema opressor.
“Sempre falei a verdade, mas não faço disso um estandarte artístico”, explicou.“Não ocultei nem na primeira entrevista que me fizeram na vida. Quando aconteceu ‘Secos e Molhados’, eu sabia que despertava uma curiosidade enorme nas pessoas.”
“Seria muito conveniente ao sistema: ele é gay e ponto. Eu sou mais do que gay.”
“Sou artista independentemente disso e defendo todas as liberdades. Posso me manifestar sobre todas as coisa que me incomodam, como a situação dos índios, dos negros.” Entre os incômodos, Ney manifestou repúdio às normas da Anvisa e do Ministério da Saúde que restringem a doação de sangue por homossexuais no Brasil.
O cantor lembrou a trajetória de Betinho, o sociólogo Herbert José de Sousa, que era hemofílico e contraiu HIV por transfusão de sangue em 1986. “Naquela época, os sangues não eram examinados com o rigor de hoje.”
Segundo informações do Ministério da Saúde, em 1985, durante os primeiros experimentos diagnósticos do HIV, a janela imunológica – período imediatamente posterior à infecção, quando os exames ainda não conseguem detectar os anticorpos contra o HIV – variava de 6 semanas a 2 meses. Hoje, a média é de 15 dias.
A Fundação Hemocentro de Brasília disse ao G1 diz que conta com tecnologias de identificação do vírus capazes de obter resultados confiáveis em prazo ainda menor – dentro de dez dias.
Descoberta em Brasília
Nos anos 1960, quando Ney Matogrosso passou uma temporada em Brasília, a capital candanga recém-construída foi sinônimo de libertação para o jovem de 20 anos que se lançava no mundo das artes. Foi aqui que, segundo ele, teve autonomia para decidir embarcar na aventura que foi o Secos e Molhados.
A vinda para a capital no início da juventude foi, ao mesmo tempo, a iniciação artística e o ponto de partida para a vida adulta – fase de responsabilidades e autossuficiência. Longe da família, Ney trabalhou como servidor público no Hospital de Base, em seu primeiro trabalho assalariado.
“Me senti independente para me aproximar de tudo que me interessava, especialmente pela arte, que era vetada pelo meu pai”, disse ao G1.
“Brasília era libertação. Foi onde tudo começou, onde me reconheci.”
A cidade onde, ainda hoje, impera o funcionalismo público, também sempre teve em sua gênese a criatividade – capital do rock e patrimônio da humanidade, Brasília busca ser reconhecida como Cidade Criativa do Design pela Unesco. Foi neste meio que Ney Matogrosso encontrou pontos efervescentes de cultura.
“Fiz teatro, pintei, cantei em coral, em um grupo de música renascentista. Me aproximei das artes, algo que sempre me atraiu e até então não tinha feito.” Apesar da imersão artística que a vivência na capital proporcionou, Brasília acabou se tornando uma obrigação funcional na medida em que Ney se afirmava como cantor.
"Trabalhava e, quando podia, tirava licença para ir para São Paulo ou pro Rio [de Janeiro]." Pouco tempo depois, a oportunidade de se lançar com “Secos e Molhados” o instigou a tomar a decisão que, para muitos concurseiros, seria considerada arriscada: abandonar a segurança financeira do cargo público.
“Ou voltava [de São Paulo] pra ser funcionário público ou pedia demissão. Preferi ficar e me arriscar. Me disseram que eu era louco, porque não pensava no futuro, na aposentadoria. Eu disse: ‘loucos são vocês, pensando em 25 anos à frente sem ter nem certeza que vão chegar lá’.”
Do grupo, Ney disse guardar lembranças positivas, pois “a memória negativa está apagada”. “Acho bom que tenha surgido na música brasileira via ‘Secos e Molhados’. Poucas tiveram a possibilidade de surgir assim.” O show deste domingo resgata uma canção daquela época, “Amor”.
Além das músicas consagradas na voz de Ney Matogrosso ao longo da carreira, o cantor interpreta “Vida louca” (Lobão), “Roendo as unhas” (Paulinho da Viola), “Fico louco” (Itamar Assumpção) e “Oração” (Dani Black), composição que inspirou o nome da turnê – “Atento aos sinais”. O figurino é assinado por Ocimar Versolato, parceiro de Ney desde 1994, em conjunto com Milton Cunha e Marta Reis.
Serviço
Atento aos sinais
Data: 29 de outubro
Hora: 19h
Local: Centro de Convenções Ulysses Guimarães – Eixo Monumental
Ingresso: De R$ 100 a R4 270 a meia-entrada
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