Com abrigos lotados, desemprego e chegada em massa de venezuelanos ao menos dez prédios abandonados foram ocupados por imigrantes em Boa Vista. Nas invasões, rotina é precária e incerta: ‘se nos tiram, vamos morar na rua’.
“Era vir para cá ou ir para rua”, resumiu Liz Morales, 28, que acabara de se mudar para um clube abandonado ocupado por mais de 500 venezuelanos em Boa Vista, capital de Roraima.
Tão lotado quanto precário, o local é um novo símbolo da crise provocada pela chegada em massa dos venezuelanos à fronteira do Brasil.
Desde o ano passado, quando cresceu o número de venezuelanos entrando no país, estrangeiros começaram a ocupar prédios públicos abandonados em Roraima, um fenômeno que agora está se expandindo.
É uma alternativa frente à superlotação dos abrigos - são 13 com 6,5 mil moradores - e viver nas ruas em meio ao período das chuvas.
Segundo a ONU, o número de migrantes e refugiados que deixaram a Venezuela desde 2016 já ultrapassou a barreira dos 4 milhões. O Brasil é o quinto país a recebê-los (168 mil), mas Roraima, que fica na fronteira, concentra ao menos 60 mil, segundo o governo do estado.
Estima-se que quase 32 mil venezuelanos morem em Boa Vista, o que corresponde a quase 10% dos 375 mil habitantes da capital, a terceira menor do país que agora vive problemas de metrópole.
"A taxa de desemprego no estado saltou de 8% para 16% em dois anos causando um trauma na economia de Roraima", disse o governador Antonio Denarium (PSL) em audiência no Senado no mês passado.
"Na educação mais de 5 mil alunos filhos de venezuelanos estão estudando na rede de escolas estaduais. Na saúde, 50% dos leitos hospitalares são ocupados por venezuelanos",
Um levantamento da operação Acolhida, a missão humanitária que cuida do fluxo migratório, mapeou em maio dez prédios abandonados com mais 1.350 venezuelanos e outros 1.493 vivendo nas ruas.
O número tem crescido ao passo que 12 mil venezuelanos foram transferidos para fora do estado após um ano e dois meses desde o início do processo de interiorização do governo federal.
Entre os que ficam os relatos são de desemprego. Só 9% dos recém-chegados conseguem emprego formal no Brasil, mostrou uma pesquisa da Organização Internacional de Migração (OIM).
"Eles se refugiaram aqui por não ter mais para onde ir e por conta do período chuvoso", explica o queniano Jonh Austin Omandi, que integra o grupo Missionários da Consolata.
Voluntário, ele vai diariamente à ocupação de 500 venezuelanos no antigo Clube do Trabalhador que estava abandonado há seis anos. Ensina português, ajuda na limpeza e alimenta os imigrantes.
"É tudo bastante precário e a população é bem grande. Há centenas de crianças, adolescentes e idosos", descreve Jonh. "São muitas pessoas, poucos banheiros e muito lixo".
Ka'ubanoko: um lugar para dormir
No espaçoso clube outrora abandonado a vida é precária e improvisada. Oferece, sobretudo, risco às crianças, que são a maioria ali (até 12 de junho, dos 510 moradores 201 tinham menos de 18 anos).
Um encanamento puxa água da rua para dentro do prédio e o telhado está cheio de infiltrações. Há fios elétricos emaranhados perto das janelas e sobre o chão.
Os venezuelanos se dividem entre barracas de camping, barracos improvisados e escombros. A maioria deles são índios da etnia Warao, que também imigra em massa para o Brasil.
Logo na entrada do clube uma placa escrita à mão chama a atenção. Afixada ao lado da entrada, enumera as regras de convivência para os índios e não-índios do "Ka'ubanoko", como foi batizado o espaço.
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