A possibilidade de prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a decisão da presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, de não pautar novamente julgamento sobre o cumprimento de pena após condenação em segunda instância agravaram a crise entre os ministros da Corte. Uma reunião que seria realizada ontem para tratar do assunto acabou não ocorrendo, o que provocou reação do decano do STF, Celso de Mello, e deixou claro o impasse que divide os 11 ministros.
O decano afirmou que faltou pouco para que algum ministro apresentasse, durante a sessão da quinta-feira passada, dia 15, uma questão de ordem que poderia levar ao novo julgamento das ações que tratam do tema mesmo sem Cármen Lúcia pautá-las.
Como o encontro não ocorreu, há a possibilidade de o tema voltar nesta quarta-feira, 21, ao plenário do STF. "A questão de ordem seria para que ela (Cármen Lúcia) designasse dia para o julgamento", disse o ministro Marco Aurélio Mello, que é relator de duas ações e já liberou os processos para julgamento. "Precisamos sair desse impasse. Esse impasse não atende aos interesses institucionais. Não se tem almejado segurança quando os próprios integrantes do Supremo divergem em decisões. Isso gera uma perplexidade muito grande."
A proposta de uma reunião entre os ministros, segundo Celso de Mello, tinha por objetivo evitar que se chegasse a esse ponto, o que ele classificou como "constrangimento". "Nunca aconteceu na história do Supremo. Ao menos nos quase 29 anos que estou aqui", disse o decano.
Em 2016, o Supremo já havia decidido, por 6 votos a 5, que o cumprimento de pena poderia ocorrer após condenação em segunda instância. Petistas e advogados afirmam que a prisão só pode ocorrer após o trânsito em julgado no STF. O tema voltou a pressionar a Corte com a possibilidade de prisão de Lula, mas Cármen Lúcia, a quem cabe definir a pauta, já reafirmou que não colocará em discussão. A resistência aumentou a tensão entre os ministros.
"Foi para evitar que a presidente sofresse uma cobrança inédita na história do Supremo, que eu ponderei aos colegas que seria importante uma discussão interna", afirmou Celso de Mello, destacando que apresentou a ideia da reunião a Cármen Lúcia na quarta-feira passada (14) em conversa da qual também participou o ministro Luiz Fux. "Quem deveria fazer o convite é a presidente. Ficou combinado que ela, que aceitou a sugestão desse encontro informal, faria esse convite. Ontem (segunda-feira, 19) e hoje (terça) não houve", disse o decano ao ser questionado sobre o cancelamento da reunião.
Segundo a assessoria de Cármen Lúcia, ela concordou em participar da reunião, mas não entendeu que deveria convidar os pares. Ministros disseram ao Estado não terem sido chamados.
Advogados
Nesta terça-feira, representantes de institutos de advocacia estiveram nos gabinetes dos ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello para defender a necessidade de julgamento definitivo das ações. As entidades foram ao Supremo a convite do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, autor de uma das duas ações que tratam do tema. "Virou uma loteria. Quem entra com habeas corpus fica dependendo de quem vai relatar o pedido", afirmou Fábio Tofic, do Instituto de Defesa do Direito de Defesa.
Também na terça, o ministro Edson Fachin negou recurso apresentado pelo Instituto Ibero Americano de Direito Público contra a decisão do plenário sobre o assunto. Com isso, esses recursos não devem motivar uma rediscussão.
Condenados
Condenado a 34 anos de prisão por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa, o ex-vice-presidente da Engevix Gérson de Mello Almada se entregou nesta terça à Polícia Federal, em Curitiba. O empreiteiro chegou à PF com um capuz cobrindo a cabeça.
Na segunda-feira, 19, o juiz federal Sérgio Moro ordenou a execução da pena do ex-executivo após sua condenação ser confirmada em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Almada é um dos nove condenados na Lava Jato a cumprir pena em regime fechado após decisão ser confirmada em segunda instância.
Ao mandar prender o empreiteiro, Moro advertiu que uma eventual alteração no entendimento do Supremo sobre a execução de pena após decisão de 2ª instância seria "desastrosa".
O juiz responsável pelos casos relacionados à Lava Jato em primeiro grau afirmou que a jurisprudência estabelecida pela Corte desde 2016 "é fundamental, pois acaba com o faz de conta das ações penais que nunca terminam".
Moro disse que eventual alteração no entendimento "colocaria em liberdade vários criminosos poderosos condenados por corrupção e lavagem de dinheiro."
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