Entidade administrou a Cidade da Criança, em Presidente Prudente.
Condenação a ressarcimento permanece na decisão da segunda instância.
A 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) manteve o entendimento de irregularidade no Termo de Parceria firmado pela Prefeitura de Presidente Prudente para o Instituto de Gestão de Projetos da Noroeste Paulista (Gepron) administrar o Parque Ecológico da Cidade da Criança. O acórdão com o julgamento dos recursos de apelação contra a sentença da primeira instância foi registrado nesta terça-feira (21).
“As irregularidades contratuais são evidentes e justificam a manutenção da anulação do Termo de Parceria e da condenação ao ressarcimento dos danos”, aponta o acórdão, que teve como relator o desembargador Marcelo Semer.
O assunto é alvo de uma ação popular impetrada em 2012 pelo aposentado Luiz Antônio dos Santos e julgada parcialmente procedente em janeiro do ano passado pelo juiz da Vara da Fazenda Pública de Presidente Prudente, Darci Lopes Beraldo.
O Gepron, que tem sede em Araçatuba (SP), esteve à frente da administração do Parque Ecológico da Cidade da Criança entre os anos de 2011 e 2016. No ano passado, o Consórcio Intermunicipal do Oeste Paulista (Ciop) assumiu a gestão do complexo turístico, depois que a contratação do Gepron não teve sequência.
“Com efeito, a contratação do Gepron se deu em violação aos termos do edital, visto que a referida Oscip [Organização da Sociedade Civil de Interesse Público] não detinha nem experiência nem qualificação técnica para tanto, a despeito da vultosa monta contratual envolvida, superior a seis milhões de reais, para o período de doze meses, excetuada a quantia destinada com a prorrogação da avença”, prossegue a decisão da segunda instância do Poder Judiciário paulista.
O acórdão cita que o Concurso de Projetos nº 001/2011, oriundo do Processo Administrativo nº 14.448/2011, com base no qual foi formulado o Termo de Parceria entre o município e o Gepron, exigia capacidade técnica da Oscip comprovada através de atestados técnicos emitidos por parceiro público demonstrando experiência em projetos de turismo e histórico contendo as principais atividades e ações realizadas pela entidade, instruídos com cópias dos Termos de Parceria que comprovassem os programas e projetos executados.
“Todavia, a pertinência temática entre o objeto estatutário da Oscip e o objeto contratado é insuficiente, seja porque não atende os requisitos estabelecidos em edital, seja porque viola o interesse público, na medida em que deixa de garantir a qualidade exigida para o desempenho da atividade”, pontua o relator Marcelo Semer.
Segundo o acórdão, a conclusão é de que “o Gepron não detinha nem experiência nem capacidade técnica”.
Semer ressalta que a entidade foi fundada em março de 2005, sob a denominação de Instituto de Mediação e Arbitragem da Noroeste Paulista, alterada em fevereiro de 2009 para Instituto de Gestão de Projetos da Noroeste Paulista, cujos objetivos originários versavam em sua maioria sobre atividades voltadas às áreas da saúde e da assistência social.
De acordo com a decisão do TJ-SP, apenas em 15 de janeiro de 2010 foi alterado o estatuto para incluir a atividade de turismo, “o que foi feito pouco antes da divulgação do concurso de projetos nº 01/2011, que tratava do tema”, datada de 14 de julho de 2011, “sem que tenha desempenhado nenhum outro serviço relacionado com turismo no período”.
“Há apenas nota de que se teria acompanhado duas palestras relacionadas à temática, nos municípios de Buritama [SP] e Paulicéia [SP], o que não é suficiente a atender os ditames do edital e as exigências do desempenho da atividade, como já dito à exaustão”, enfatiza o desembargador.
“Visto isso, é assente que o Gepron não gozava de capacidade técnica real, face à ausência de notícia de que dispunha de conhecimento, habilidades teóricas ou práticas sobre a matéria, os quais poderiam ser adquiridos por eventual experiência anterior, mas tampouco havia. A simples modificação estatutária não se mostrou suficiente para tanto”, continua.
O acórdão acrescenta que o ex-prefeito Milton Carlos de Mello “Tupã” (PTB) responde pela insuficiência de qualificação do Gepron, “ainda que a seleção da Oscip tenha sido amparada em pareceres e manifestações favoráveis de sua equipe, porquanto o administrador não
se vincula ao posicionamento de seus assessores e a responsabilidade pela formalização do termo é sua”.
O TJ-SP ainda considera que “houve evidente desvirtuamento da Oscip, com delegação da administração do parque, tanto que constam do contrato proposta financeira, gastos com pessoal, mobiliário, equipamento, sendo que a legislação regente da relação entre Poder
Público e Oscip delimita as atividades por ela desempenhadas”.
O acórdão cita também entendimento do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) no mesmo sentido.
“Por tais motivos, inequívoca a irregularidade do Termo de Parceria e de rigor a sua anulação”, salienta Semer.
Dano aos cofres públicos
Segundo a decisão do TJ-SP, é “evidente, também, a ocorrência de dano ao erário”.
“Com efeito, é incontroverso que o Gepron detém a titularidade de conta bancária detendo R$ 2.097.007,59 (dezembro de 2013), acumulados em virtude de receita obtida com a exploração do parque. Independentemente do debate acerca da diferenciação entre lucro e superávit, certo é que o montante se encontra sob administração do Gepron e indisponível para uso do município, o que é inadmissível, injustificável e tampouco encontra respaldo legal ou editalício”, aponta o acórdão.
Embora o laudo pericial tenha encontrado justificativa global para o repasse de R$ 6.595.582,15, “não houve checagem individual dos valores despendidos”, segundo o TJ-SP.
“Recomenda-se a manutenção da condenação nesses moldes, especialmente em vista do apurado pelo Tribunal de Contas do Estado no TC-001557/005/12, onde foram constadas despesas não previstas, como a cobrança de taxa de rateio para pagamento de despesas administrativas e taxa de custeio de 13% sobre a receita arrecadada, sendo que não há plausibilidade no destacamento de quantias para despesas ou custeio, eventuais ou não, visto que toda verba já seria destinada à administração do parque, leia-se ao pagamento dos custos e despesas, sendo inadmissível a existência de lucro na avença, pelo todo quanto exposto”, enfatiza o acórdão.
“Diante da necessidade de apuração da ocorrência de pagamentos indevidos e de eventual evasão de receita, de rigor a manutenção da sentença tal como lançada, com exceção dos valores atinentes à remuneração do corpo diretivo. Observa-se que a alegação de ausência de dolo e má-fé não teria o condão de alterar o desfecho da causa, constatada ilegalidade na contratação e prejuízo ao erário”, reforça a decisão da segunda instância.
Remuneração de diretores
O julgamento na 10ª Câmara de Direito Público modificou a sentença da primeira instância apenas para afastar o dever de devolução dos valores despendidos com a remuneração de três diretores equivalente a R$ 14.081,82 do orçamento. Segundo o acórdão, “a sua devolução seria injustificável, visto que o trabalho foi efetivamente realizado devendo, portanto, ser remunerado”.
“Com relação às demais despesas, deve ser mantida a condenação ao pagamento de perdas e danos, a ser apurada em sede de liquidação de sentença, ocasião em que deverão ser comprovadas as despesas e efetuados o ressarcimento em caso de pagamentos indevidos
e evasão de receita”, define o relator Marcelo Semer.
Defesa
A decisão da primeira instância, além de anular o Termo de Parceria, condenou o ex-prefeito Milton Carlos de Mello e o Instituto de Gestão de Projetos da Noroeste Paulista ao pagamento de perdas e danos, a ser apurado em liquidação de sentença. Observou que a apuração das perdas e danos deve se ater ao objeto do caso, no que diz respeito ao efetivo prejuízo material (pagamentos indevidos e evasão de receita), compensando-se com eventual lucro obtido pelo município pela parceria e apurando-se as responsabilidades individuais dos condenados.
Em sua defesa apresentada ao TJ-SP, o ex-prefeito argumentou, em linhas gerais: ausência de ilegalidade e de prejuízo ao erário; que não deve responder por eventual insuficiência de
qualificação do Gepron, visto que se amparou em pareceres e manifestações favoráveis de sua equipe; ausência de dolo ou má-fé; que a questão do superávit no mês de dezembro no valor de R$ 2.097.007,59 se justifica pela necessidade de reserva financeira, a fim de garantir, ao final do Termo de Parceria, os direitos trabalhistas, e o remanescente retornará aos cofres públicos; a gerência do complexo da Cidade da Criança exigia contratação de pessoa qualificada, o que explica o salário médio de R$ 14.081,82; as receitas auferidas foram repassadas integralmente ao município; as divergências relacionadas ao número efetivo de visitantes foram explicadas em contestação e competem ao Gepron e as gratuidades e cortesias se justificam pela estratégia de marketing; e que não houve terceirização a exigir a submissão à Lei de Licitações.
Já o Gepron alegou, preliminarmente, cerceamento de defesa e ofensa ao contraditório, em
vista da ausência de intimação das partes para manifestação após a juntada de documento novo, consistente na decisão do Tribunal de Contas do Estado. No mérito, alegou que o valor despendido com a parceria teria sido justificado, inexistindo danos financeiros ao erário, consoante conclusão da perícia contábil judicial; o valor depositado será devolvido ao município ao término da parceria, com juros e correção, tendo havido interpretação equivocada de institutos na sentença, que equiparou superávit a lucro; ausência de base legal ou jurídica no tocante ao salário do administrador, justificado em vista da complexidade e da responsabilidade relativas às funções exercidas e da discricionariedade administrativa; as decisões administrativas do TCE-SP, embora tenham considerado irregulares o Termo de Parceria e a primeira prestação de contas, não transitaram em julgado, sendo passíveis de recomendações e ajustes sanáveis e não tratarem de desvio de finalidade, dano ao erário ou má-fé dos gestores; e os gastos de 2010 não seriam comparáveis aos de 2011 e 2012, quando o parque foi transformado em polo turístico regional.
Ainda de acordo com a defesa do Gepron, a perícia contábil não encontrou irregularidade nos valores arrecadados pela entidade e o excedente se encontra em conta bancária a ser devolvido ao final, com juros e correção; os valores obtidos com bilheteria são revertidos para o município, de modo que não teria havido repasse de bens públicos à entidade, com delegação e terceirização da administração da Cidade da Criança, apenas compartilhamento de gestão, fomento e fiscalização; a finalidade da entidade seria, sim, compatível com o objeto do ajuste, devendo-se diferenciar qualificação legal de experiência; e a economicidade da parceira pode ser constatada, por exemplo, pela contratação de mão de obra através da Oscip.
Ao final, o Gepron requereu que a ação fosse julgada improcedente ou, alternativamente, que fosse afastada a condenação em ressarcimento, por haver prestação de serviço sem configuração de dano ao erário, com a extinção dos honorários advocatícios ou a sua redução, caso mantidos.
Segundo o acórdão do TJ-SP, a Prefeitura de Presidente Prudente também se manifestou e argumentou, em resumo: ausência de dano ao erário, ante a presença de justificativa para o valor da parceria e respaldo em plano de trabalho; diferença entre lucro e superávit,
sendo que os valores superavitários seriam recursos públicos pertencentes ao município, independente de estarem em conta bancária de outra titularidade; o número de diretores e suas remunerações justificaram-se em face da magnitude do parque; os julgamentos do
TCE-SP não transitaram em julgado; o parque não foi destinado ao Gepron, apenas firmado vínculo de cooperação; e o Gepron demonstrou qualificação técnica na área de turismo, consoante documentos de habilitação. Ainda requereu a reforma da sentença para julgar
a ação improcedente.
Outro lado
O advogado João Baptista Mimesse Gonçalves, que atua na defesa do ex-prefeito Milton Carlos de Mello, afirmou ao G1 nesta quarta-feira (22) que ainda não foi intimado a respeito do acórdão da 10ª Câmara de Direito Público do TJ-SP. "Tenho de examinar para tomar conhecimento do acórdão para me pronunciar", explicou.
O G1 também solicitou um posicionamento oficial da Prefeitura de Presidente Prudente sobre a decisão da segunda instância e a Secretaria Municipal de Comunicação informou que o caso “está sob análise do jurídico”.
O G1 ainda pediu um posicionamento oficial do Gepron sobre o assunto, mas não obteve resposta até o momento desta publicação.
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