Em mensagem anual à Cúria romana, Pontífice chamou crimes de 'abominações' e disse que Igreja nunca mais vai ignorá-los
ROMA — A Igreja Católica não vai mais ignorar as "abominações" dos membros do clero que cometeram abusos sexuais e "não se cansará de fazer todo o necessário para levar à Justiça qualquer um que tenha cometido tais crimes", afirmou o Papa Francisco em sua mensagem anual à Cúria Romana. Num discurso duro e direto, o pontífice insistiu que não se guarde silêncio sobre os casos que atingem a Igreja "porque o maior escândalo nesta matéria é encobrir a verdade".
— A Igreja nunca tentará acobertar ou subestimar nenhum caso. É inegável que alguns responsáveis, no passado, por falta de cuidado, por incredulidade, por falta de preparo, por inexperiência ou por superficialidade espiritual e humana trataram muitos casos sem a devida seriedade e rapidez. Isto nunca deve voltar a acontecer. Esta é a escolha e a decisão de toda a Igreja — insistiu Francisco, diante dos principais líderes do governo do Vaticano.
A manifestação de Francisco chega dois meses antes de uma cúpula extraordinária sobre a crise de abusos sexuais no âmbito da Igreja Católica, à qual devem comparecer chefes de cerca de 110 conferências nacionais de bispos e dezenas de especialistas e líderes de ordens religiosas. Nas ocasiões passadas de mensagem de Natal, o Papa denunciou casos de corrupção e má gestão da Cúria. Desta vez, concentrou-se na crise global de abusos sexuais.
"Lobo atroz"
Francisco reservou palavras especialmente duras para os "homens consagrados, que abusam dos fracos, valendo-se de seu poder moral e da persuasão".
— Cometem abominações e continuam exercendo seu ministério como se nada tivesse acontecido. Eles não têm medo de Deus e de seu julgamento, mas apenas de serem descobertos e desmascarados — denunciou o pontífice. — Dilaceram o corpo da Igreja.
Francisco ressaltou que, por trás da aparência de "grande amabilidade" e de "rosto angelical", homens da Igreja "ocultam descaradamente um lobo atroz, pronto para devorar as almas inocentes".
O Papa pediu, no entanto, que as pessoas diferenciem os verdadeiros casos de abusos sexuais das calúnias sem fundamento, dentro da Igreja e também em outras esferas da sociedade.
— Aos que abusam dos menores, queria dizer: convertam-se e entreguem-se à justiça humana, e preparem-se para a justiça divina — afirmou o pontífice, em apelo direto aos religiosos agressores para que se rendam à justiça civil de seus países.
Quando o Pontífice fez promessas similares de tolerância zero com os abusos, grupos de vítimas cobraram da Igreja uma clara política para responsabilizar bispos que tenham manipulado ou acobertado apurações de crimes. Para estes grupos, tal protocolo deve ser elaborado na cúpula extraordinária de fevereiro.
O próprio Francisco foi criticado, no início do ano, por defender com veemência um bispo chileno acusado de encobrir abusos. Só mais tarde ele pediu a abertura de uma investigação e aceitou a renúncia do bispo e de outros prelados no Chile.
Numerosos casos de pedofilia têm sido dencunciados, envolvendo membros do clero em diversos países, como Estados Unidos, Chile e Austrália. Na última quarta-feira, a Procuradoria-geral de Illinois denunciou 700 clérigos por abuso sexual , numero bem superior ao admitido pela Igreja nesse estado americano. De acordo com as autoridades, denúncias feitas à instituição não foram completamente investigadas.
Nesta sexta, um ex-padre francês de 85 anos foi condenado a 18 meses de prisão em Saint-Etienne por abusos sexuais de menores nos anos 80. Peyrar era capelão de um liceu em Montbrison e responsável pela organização de acampamentos de verão. A acusação partiu de um empresário de 38 anos, que foi vítima do então padre quando era menor e participou do acampamento.
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